Meningite criptocócica é uma condição oportunista com alta mortalidade em indivíduos com infecção pelo HIV. A presença de hipertensão intracraniana é comum e a realização de punções lombares terapêuticas– ou de outros métodos de drenagem liquórica– é considerada um dos pilares do manejo desses pacientes.
Pelas recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Infectious Diseases Society of America ( IDSA), a realização e a frequência de punções lombares terapêuticas são baseadas na medida da pressão de abertura liquórica inicial. Drenagem de líquor é recomendada sempre que a pressão de abertura for maior do que 25 cmH2O ou na presença de sintomas neurológicos, devendo ser repetida diariamente até que a pressão se stabilize ou sintomas estabilizem por pelo menos dois dias consecutivos.
Atualmente não há recomendação para a realização de punções lombares na ausência de hipertensão intracraniana ou com pressão de abertura typical. Entretanto, diversos estudos têm demonstrado que drenagens adicionais, independente da pressão de abertura inicial ou da presença de sintomas, aumentaria sobrevida.
Um estudo investigou o impacto de punções lombares em série na primeira semana de tratamento sobre sobrevivência em até 30 dias e possíveis fatores de risco para hipertensão intracraniana em pacientes HIV positivos com meningite criptocócica.
Materiais e métodos
Eram elegíveis para o estudo pacientes adultos com infecção pelo HIV e com primeiro diagnóstico de meningite criptocócica. Todos os participantes foram tratados com o esquema padrão de anfotericina B por 14 dias associada a fluconazol por quatro semanas, seguidos de manutenção com fluconazol por oito semanas.
Punção lombar foi realizada na entrada do estudo para mensuração da pressão de abertura e cultura. Pelo protocolo, outras punções estavam programadas para os dias 3, 7, 10 e 14, mas punções adicionais poderiam ser realizadas a critério da equipe assistente.
Resultados
Foram incluídos 533 indivíduos com primeiro diagnóstico de meningite criptocócica. Os participantes foram estratificados de acordo com a pressão de abertura inicial: < < 20 cmH2O, 20-- 35 cmH2O e > > 35 cmH2O.
Participantes com pressão de abertura > > 35 cmH2O tinham maior probabilidade de apresentar-se com alteração de consciência (ECG < < 15), crises convulsivas, déficits neurológicos focais e alterações visuais, além de maior carga fúngica nas culturas de líquor. Nesse grupo, houve tendência a uma maior proporção de indivíduos sem tratamento antirretroviral, mas sem significância estatística. Também não houve diferença entre os grupos em relação à contagem basal de linfócitos T-CD4.
Na avaliação de mortalidade em 30 dias, a menor proporção de mortes ocorreu no grupo com pressão de abertura na faixa entre 20– 35 cmH2O (29,9%). Embora as proporções tenham sido semelhantes nos grupos com pressão < < 20 cmH2O (42,3%) e os com pressão > > 35 cmH2O (41,6%), a mortalidade em 14 dias foi maior no último grupo.
Nos modelos ajustados, não houve diferença entre os grupos em mortalidade em 14 dias, com HR = 1,34(IC 95% = 0,83– 2,14; p = 0,23) no grupo com < < 20 cmH2O e HR = 1,53(IC 95% = 0,98-- 2,38; p = 0,06). Já para mortalidade em 30 dias, o grupo com pressão de abertura inicial < < 20 cmH2O apresentou maior risco de morte (HR = 1,5; IC 95% = 1,01-- 2,23; p = 0,04) quando comparado com os outros grupos (HR = 1,44; IC 95% = 0,97-- 2,13; p = 0,07).
Entre os participantes que sobreviveram por mais de sete dias, os que não receberam punções lombares adicionais apresentaram maior mortalidade (33%) quando comparados com os que receberam uma punção adicional (22%) e com os que receberam outras duas ou mais punções lombares (19,5%) nos primeiros sete dias da fase de indução, independente da pressão de abertura basal.
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